RECURSOS PARA O CIDADÃO
Advertências:
Apresentamos informações gerais sofre cefaleias.
A sua leitura e a sua compreensão não habilitam os cidadãos a fazer diagnósticos, nem a propor orientações, nem a sugerir tratamentos; esses são trabalhos médicos.
Estes textos não servem como material de estudo para alunos de medicina, nem como atualização teórica para profissionais de saúde; as informações são corretas, mas o seu conteúdo científico é insuficiente.
Em sentido estrito “Cefaleia” é a palavra médica para designar desconforto ou dor de cabeça. No entanto, uma cefaleia raramente aparece como sintoma isolado.
Algumas entidades classificadas genericamente como “Cefaleias” apresentam uma grande variedade de outros sintomas para além da dor (ver abaixo, por exemplo, as características da enxaqueca).
A Classificação Internacional de Cefaleias inclui 14 grandes tipos. Estes tipos principais dividem-se e subdividem-se em mais de 200 formas diferentes.
Por exemplo: A enxaqueca, um dos grandes tipos, divide-se em cerca de 20 formas diferentes.
Podemos dizer que as cefaleias primárias são uma doença em si mesmas, não traduzindo ou expressando outros problemas de saúde.
As cefaleias primárias são a maioria (cerca de 90%).
Exemplos: cefaleias de tipo tensão, enxaquecas, cefaleias em salva.
A chave do diagnóstico está na história clínica: anamnese (entrevista) e exame físico, incluindo exame neurológico. No entanto, por vezes, é necessário recorrer a exames complementares.
A enxaqueca é uma entidade primária e paroxística (episódios exuberantes intervalados por períodos sem sintomas). Os sintomas impedem frequentemente o trabalho ou o estudo.
A dor geralmente é:
– pulsátil (como se o coração batesse dentro da cabeça); este latejar agrava-se com o esforço físico ou com movimentos da cabeça.
– hemicraniana (só de um lado), mas podendo localizar-se em qualquer parte da cabeça.
– acompanhada de náuseas, vómitos, intolerância à luz (fotofobia), ao ruído (fonofobia) e a alguns cheiros; geralmente as pessoas procuram um local escuro e sossegado onde possam repousar ou adormecer.
Um episódio pode durar de poucas horas até três dias. Entre as crises, habitualmente não há queixas.
A periodicidade é muito variável; há pessoas que têm 2 crises por semana; outras terão apenas algumas ao longo da vida.
Alguns tipos de enxaquecas podem apresentar sintomas mais complexos (enxaquecas com aura).
É uma enxaqueca que inclui sintomas neurológicos transitórios, com origem atribuível a certas zonas do encéfalo. Os restantes sintomas são idênticos aos da enxaqueca sem aura.
As auras mais comuns são perturbações exuberantes e passageiras da visão; manifestam-se por perda de visão de um dos lados do campo visual (que não de um dos olhos), turvação das imagens, perceção de pontos luminosos, de figuras geométricas ou de zig-zags brilhantes.
Outras auras podem traduzir-se por formigueiro ou dormência de um lado da face ou de uma das mãos. Há pessoas que têm dificuldades em falar ou mesmo paralisias passageiras dos membros, habitualmente só de um dos lados do corpo.
Estas alterações duram cerca de 10 a 30 minutos e antecedem a dor.
É um tipo pouco comum de enxaqueca; apenas cerca de 15% de todas as pessoas com enxaqueca terão aura.
Nem por isso. Na verdade há algumas características da enxaqueca muito associadas ao ciclo reprodutivo feminino: incremento de prevalência depois da primeira menstruação; predileção temporal frequente pelo período menstrual; agravamento ocasional pela pílula anticoncecional ou terapêutica hormonal; atenuação ou desaparecimento durante a gravidez ou na menopausa.
Os rapazes e as meninas são atingidos por igual. A partir da adolescência, a enxaqueca é mais frequente no sexo feminino. No geral, a enxaqueca será 2 a 3 vezes mais prevalente no sexo feminino. Na enxaqueca sem aura teremos 5 mulheres para 1 homem. Na enxaqueca com aura teremos 3 mulheres para 2 homens.
Sim. A dor tende a ser bilateral, menos intensa e de duração mais curta. A fonofobia ou fotofobia podem ser deduzidas do comportamento de crianças pequenas, incapazes de descrever os sintomas. Os vómitos e olheiras podem ser exuberantes. As perturbações de horários de sono e refeições são fatores precipitantes comuns.
O tratamento da crises de enxaqueca na criança é mais fácil do que no adulto; o sono dá habitualmente bons resultados.
Na criança a localização occipital da cefaleia não é normal; se acontecer a criança deve ser observada por um especialista. Tal como as crianças muito pequenas, com cefaleias há pouco tempo, com vómitos matinais ou outros sintomas incomuns.
Há pessoas em que a enxaqueca aparece preferencialmente ao fim de semana. Estas crises podem ser precipitadas por privação, excesso ou alteração do horário de sono, pela falha do pequeno-almoço ou do café habitual da manhã. A descompressão do fim-de-semana (suspensão rápida do stress sócio-profissional), o abuso de bebidas alcoólicas ou de drogas também poderão ter algum papel. Aconselha-se estas pessoas a ponderar as mudanças radicais de estilo de vida durante o fim-de-semana.
Algumas pessoas conseguem identificar fatores precipitantes ou desencadeantes para as suas crises. Existem uma série de fatores desencadeantes das crises, ou seja, situações que em pessoas sem enxaqueca não têm qualquer consequência, mas que nas pessoas com enxaqueca levam a que apareça uma crise. Estes fatores não são iguais para todas as pessoas com enxaqueca e vão variando ao longo da vida.
Os fatores que mais frequentemente desencadeiam crises de enxaqueca são:
1) Fatores hormonais, nas mulheres como a menstruação, a ovulação ou a toma da pílula anticoncetiva;
2) Fatores psicológicos tais como a ansiedade, o stress e pós-stress e a depressão;
3) Fatores climáticos como tempo quente, enevoado e abafado;
4) Estímulos olfativos, visuais ou sonoros, como cheiro intenso a perfumes, tintas, tabaco, exposição à luz ou ruídos intensos e fatores alimentares como jejum prolongado, ingestão de bebidas alcoólica ou excesso de cafeína.
Não, definitivamente. As náuseas (enjoos) e vómitos das crises de enxaqueca têm origem cerebral. Aparecem em pessoas com vesícula biliar e fígado perfeitos. Os sintomas digestivos são uma consequência da enxaqueca (e não a sua causa).
Não tem cura, mas tem tratamento. Há medicamentos e comportamentos que podem reduzir a frequência, duração ou intensidade das crises. Os doentes devem fazer um registo-calendário das crises e factos associados. Isso ajudará a definir uma estratégia de tratamento.
As cefaleias podem ser tratadas pelo médico de família. Em situações difíceis os doentes devem ser encaminhados para especialistas. À partida, os neurologistas ou os neuropediatras distinguirão mais facilmente as cefaleias primárias das secundárias, e terão mais experiência no seu tratamento. Os doentes com cefaleias que traduzem problemas psíquicos relevantes deverão ser tratados por psiquiatras. Só excecionalmente é necessário recorrer a outras especialidades médicas.
A Cefaleia em Salva (classicamente conhecida por Cluster Headache) é um tipo raro de dor ocular e para-orbitária. Os doentes descrevem-na como a sua experiência dolorosa mais violenta de sempre.
Aparece apenas de um lado da fronte, e pode acompanhar-se de lacrimejo, queda da pálpebra superior, olho vermelho, pupila pequena e rinorreia (pingo pelo nariz).
Atinge quase exclusivamente o sexo masculino, aparecendo pela primeira vez no adulto jovem.
Dura pouco mais de meia hora. Pode repetir-se várias vezes num dia, durante 4 a 8 semanas (salva); pode desaparecer durante meses ou anos.
Tem algumas predilecções por certas horas do dia (especialmente pelo início da madrugada), pela Primavera e Outono.
Os doentes ficam muito inquietos e agitados durante as crises, ao contrário do que acontece aos sofredores de enxaqueca.
Uma das características mais curiosas do Cluster Headache é a melhoria das crises com a inalação de oxigénio.
É sempre aconselhável uma consulta antes de engravidar de forma a evitar-se o mais possível medicações desnecessárias, sobretudo nas primeiras semanas de gestação. Durante a gravidez é muito frequente assistir-se a uma melhoria da enxaqueca o que ocorre em 80 a 90% dos casos e está relacionada com o aumento dos estrogénios. Assim, os medicamentos quer para aliviar quer para prevenir as crises podem não ser necessários. Nesta fase privilegiam-se as terapêuticas não farmacológicas como a higiene do sono, exercício físico, redução do stress. No entanto, sempre que é necessário existem fármacos que podem ser utilizados de forma segura. Nas crises podem usar-se o paracetamol e os anti-inflamatórios não esteroides, estes últimos com maior segurança no segundo trimestre de gestação. A terapêutica preventiva fica reservada aos casos mais graves. Atualmente já dispomos de terapêuticas inovadoras como a neuroestimulação não invasiva que é segura na prevenção durante a gravidez. As crises de enxaqueca voltam a ser mais frequentes no período pós-parto, o que é justificado pelas alterações hormonais, stress e privação do sono.
No período da amamentação é imprescindível o aconselhamento médico já que os medicamentos, quer de alívio quer de prevenção, podem ser excretados no leite e produzir efeitos secundários no bebé. É considerada segura a utilização do paracetamol, dos anti-inflamatórios não esteroides e de alguns triptanos. Os fármacos preventivos, tal como na gravidez, ficam reservados aos casos mais graves.
Na perimenopausa, o período temporal que ocorre entre dois a oito anos antes da menopausa, a enxaqueca pode piorar. Este fenómeno está mais uma vez relacionado com a descida dos níveis de estrogénios. Após a menopausa existe uma melhoria substancial. A terapêutica de substituição hormonal pode agravar a enxaqueca mas não é contraindicada em absoluto. As indicações para esta medicação devem ser discutidas em consulta médica.
Não. A enxaqueca é uma das cefaleias mais frequentes, significativas e bem caracterizadas. Mas, há muitas outras.
De um ponto de vista prático, poderemos dividir as cefaleias em dois grandes grupos:
– Primárias (ou idiopáticas)
– Secundárias (ou sintomáticas).
As cefaleias secundárias são sintomas de doenças do sistema nervoso ou de outros órgãos do corpo humano.
As cefaleias secundárias podem traduzir situações comuns. Exemplos: gripe, intoxicação ou abstinência alcoólica, pequenos traumatismos cranianos, hipoglicemia (baixa de açúcar), crise de hipertensão arterial.
As cefaleias secundárias a doenças graves do sistema nervoso (meningites, tumores, hemorragias por rotura de aneurismas) são uma minoria.
O exame neurológico não um exame complementar ou tecnológico.
O exame neurológico é um conjunto de testes feito no consultório, com a ajuda de alguns instrumentos simples (oftalmoscópio, martelo de reflexos, diapasão, alfinete, fontes de frio e calor).
O médico pode testar, com ênfases variáveis, diferentes funções de cérebro, cerebelo, tronco cerebral, medula, raízes, plexos, nervos, placa motora e músculos.
O exame neurológico tem uma sequência coerente, mas deve ser adaptado caso-a-caso em função da anamnese (entrevista prévia). A interpretação do exame neurológico exige sólidos conhecimentos de anatomia e fisiologia do sistema nervoso, e deve ser conjugada com anamnese.
No caso das cefaleias, a observação do fundo de olho, usando um oftalmoscópio, é uma parte muito importante do exame neurológico.
Não. As características descritas acima são as mais significativas. Não é obrigatório que estejam todas simultaneamente presentes. O diagnóstico é feito pelo conjunto e não por nenhuma característica particular (mesmo que muito clássica).
Por exemplo:
– a unilateralidade alternante (ora esquerda, ora direita) é muito típica; mas, há pessoas em que a cefaleia é sempre do mesmo lado; há mesmo casos de localização bilateral;
– os vómitos são característicos, mas estão ausentes em metade das crises.
Aceita-se que 8 a 15% dos cidadãos dos países ocidentais sofrem de enxaqueca. A enxaqueca é mais frequente do que a asma ou a diabetes, por exemplo. O facto de atingir as pessoas nas idades mais produtivas da vida, implica grandes custos económicos, sociais e familiares.
Habitualmente entre os 15 e os 40 anos, mas pode aparecer na infância ou logo após a menarca (primeira menstruação). Se aparecer pela primeira vez depois dos 45 anos deveremos excluir outras causas.
As crises de enxaqueca não são sempre iguais, algumas são mais intensas e outras mais ligeiras. Nas crises mais fortes, por vezes os medicamentos não são eficazes mas o facto de falharem nalgumas ocasiões não significa que nunca mais sejam úteis. Por vezes, quando a frequência das crises de enxaqueca aumenta, pode haver fases em que as dores de cabeça são diárias ou quase diárias (mais de 15 dias por mês), denomina-se essa fase da doença por «Enxaqueca crónica». Uma vez atingida essa fase há que adaptar o tratamento da enxaqueca, mas é frequente a enxaqueca melhorar e voltar à fase em que as crises eram ocasionais (Enxaqueca episódica).
A enxaqueca é provocada por mecanismos muito complexos e muito bem estudados.
Podemos dizer que se deve a uma combinação de processos a nível cerebral: excitação/ depressão de células, dilatação de artérias e libertação de substâncias químicas. As pessoas com enxaqueca serão mais sensíveis a certos estímulos (ambientais ou do seu próprio organismo) que podem desencadear esses complicados processos cerebrais.
Pensa-se que haverá alguma suscetibilidade genética à enxaqueca; há mesmos tipos hereditários de enxaqueca com aura.
As pessoas que tomam café com regularidade podem ter cefaleias se interrompem esse hábito. Muitas pessoas melhoram com o café durante as crises de enxaqueca, mas algumas podem piorar.
Doenças oculares como a miopia, astigmatismo, hipermetropia, e presbiopia, quando não corrigidas causam aumento do esforço dos músculos em torno dos olhos para melhorar a nitidez das imagens, Este esforço por um tempo prolongado pode causar dores de cabeça, que habitualmente surgem após algumas horas a ler, ver televisão ou olhar para o computador. Outros sintomas que podem surgir são o lacrimejo e vermelhidão dos olhos. Quando a dor de cabeça é apenas devida aos problemas da visão, o uso de óculos ou lentes de contato pode resolver as dores de cabeça.
Nas pessoas com enxaqueca, as crises de dor de cabeça podem ser desencadeadas por vários fatores, sendo exemplos o stress, o cansaço, fome e poucas horas de sono. Os problemas de visão, pelo aumento do esforço visual, podem agravar a enxaqueca e tornar as crises de dor de cabeça mais frequentes e mais fortes, no entanto, não são a sua verdadeira causa. Quando as pessoas com enxaqueca têm queixas de visão devem ir ao oftalmologista, pois o uso de óculos ou lente de contacto pode diminuir a frequência das dores de cabeça. Todavia é natural que continuem a ocorrer dores de cabeça.
O diagnóstico da enxaqueca é feito pela história clínica (interrogatório e observação). Os resultados dos exames complementares são normais.
Em casos raros e mais estranhos de enxaqueca, havendo dúvidas, o médico poderá recorrer a exames de imagem (TAC ou ressonância magnética) para excluir outras doenças. O electroencefalograma não é útil.
Os tratamentos são de 2 tipos:
Tratamento sintomático (na crise aguda)
O doente deverá deitar-se num local sossegado e escuro. Pode ainda aplicar pressão ou frio no local da dor. Os medicamentos recomendados para a crise de enxaqueca são: analgésicos simples, anti-inflamatórios e triptanos (agonistas da serotonina). Os médicos têm critérios para escolher a melhor solução para cada doente.
Tratamento profilático
As pessoas com enxaqueca deverão construir calendários de crises que permitam identificar fatores precipitantes e valorizar o impacto das crises na qualidade de vida.
O primeiro passo da profilaxia poderá ser o evitamento dos fatores precipitantes, se isso for possível.
Em algumas pessoas, em alguns períodos da vida, será necessário recorrer a medicamentos de uso diário para diminuir as crises (em frequência, em duração ou em intensidade). Existem fármacos preventivos orais que foram criados para outros fins e que demonstraram a sua eficácia; é o caso de alguns anti-hipertensivos, alguns antidepressivos e alguns antiepilépticos. Dispomos também de outros fármacos, injetáveis, que são fármacos de segunda linha como é o caso da toxina botulínica e ainda de fármacos preventivos desenvolvidos especificamente para a enxaqueca: os anticorpos monoclonais anti-CGRP. Os médicos têm critérios para escolher o medicamento mais ajustado a cada doente.
A cefaleia de tensão é a mais frequente das cefaleias primárias. Caracteriza-se por uma dor ligeira a moderada, como um peso, pressão, aperto ou moinha. Muitas vezes é sentida como um capacete pesado ou uma banda opressiva. Pode acompanhar-se de náuseas e fonofobia (intolerância ao ruído). Por vezes, verifica-se uma contração excessiva dos músculos do pescoço e ombros. Pode durar horas ou dias e em alguns casos é praticamente contínua.
Distingue-se da enxaqueca porque, na maioria dos casos a cefaleia de tensão:
– é bilateral,
– a intensidade é mais leve;
– não é latejante;
– não se exacerba com o esforço físico;
– não se acompanha de vómitos;
– o ruído é menos tolerado do que a luz.
A cefaleia de tensão divide-se em:
– episódica pouco frequente (menos de 1 dia por mês)
– episódica frequente (1 a 15 dias por mês)
– crónica (mais de 15 dias por mês).
A sinusite é uma inflamação dos seios da face que pode causar dores de cabeça. A dor geralmente localiza-se na região do seio afetado, mais frequentemente na cara, envolvendo a região do nariz, testa ou maçãs do rosto, mas também podem causar dor em toda a cabeça. A dor é mais frequentemente uma sensação de pressão ou peso na cabeça que agrava ao pressionar o local, e geralmente associa-se a sintomas nasais, como o corrimento nasal ou o nariz entupido. Pode ainda associar-se febre, cansaço, tosse, dores musculares e perda de apetite. Nas pessoas com enxaqueca, a sinusite pode agravar as dores de cabeça e tornar as crises de enxaqueca mais frequentes e fortes, no entanto não é a sua causa. Nestes casos, o tratamento da sinusite pode melhorar essa crise, mas as enxaquecas vão continuar a ocorrer.
A enxaqueca resulta de fatores genéticos e é hereditária, tendo os familiares de pessoas com enxaqueca um aumento do risco de também terem enxaqueca. Quando um dos pais tem enxaqueca, o risco de um filho ter a doença é de 50% e se ambos os pais têm enxaqueca, o risco de um filho ter a doença é de 75%.
A enxaqueca é uma palavra que deriva do árabe ax-xaquica, cujo significado é «metade da cabeça», pois é muito frequente esta dor se localizar apenas num dos lados da cabeça. Afeta mais frequentemente a zona anterior da cabeça, a testa, o olho ou a zona da têmpora mas pode ocorrer em qualquer local, até no pescoço ou na face. Por definição, a dor da enxaqueca não tratada vai piorando, interfere com as atividades ou impede a pessoa de funcionar. Apenas em 1% das crises os doentes referem ter sido capazes de funcionar normalmente durante a mesma, enquanto em 33% das crises têm que ficar na cama, faltar ao trabalho ou ir ao hospital. O mais habitual na dor da enxaqueca é surgir como uma moínha que se vai intensificando e, quando está forte ou quando se faz um esforço ou baixa a cabeça a dor adquire um caráter latejante ou pulsátil como se fossem marteladas na cabeça. As crises de enxaqueca podem aparecer a qualquer hora do dia, incluindo durante o sono, e a qualquer momento, se bem que seja mais fácil ter crises em fases que os doentes estejam mais cansados e sujeitos a mais stress.
As crises de enxaqueca são autolimitadas – mesmo sem tratamento passam, por definição, em menos de 3 dias. No entanto, em mais de metade das crises, o não tratar implica passar esse tempo em sofrimento, frequentemente de cama, a vomitar e sem conseguir ver ou ouvir nada ou ninguém. O tratamento da crise visa aliviar o sofrimento provocado por esta doença e restaurar o doente à sua capacidade de funcionar normalmente. Não faz sentido esperar que a dor fique intensa antes de tratar, pois tal implica condenar o doente a um período evitável de sofrimento. Além disso, a eficácia do tratamento é tanto maior quanto mais cedo na crise este se efetua. O primeiro medicamento a ser utilizado deve ser o que habitualmente é mais eficaz, para melhorar a probabilidade de controlo da crise. Embora o vómito muitas vezes alivie a crise, não é recomendado vomitar repetidamente pois tal tem consequências nefastas no estômago. A cafeína pode ser utilizada como potenciador do efeito dos analgésicos, quer na forma de bebida (café, chá preto ou Coca-cola) ou mesmo utilizando alguns fármacos que contêm cafeína, Não é frequente o café, sem analgésico associado, ser eficaz no controlo da doença de forma completa ou rápida, se bem que nalguns doentes é uma grande ajuda. O adicionar de gotas de limão no café é um hábito popular utilizado também nas gripes e nas dores de dentes. O limão tem uma ação bactericida local (na boca e gengivas) e cicatrizante- útil nas dores de dentes- e a sua riqueza em vitamina C contribui para reforçar o sistema imunológico. A sua ação na enxaqueca não é clara.
A Enxaqueca é mais prevalente nas mulheres do que nos homens e as hormonas assumem um papel importante no seu aparecimento. Se durante a infância a prevalência é igual em ambos os géneros, após a puberdade duplica nas mulheres. Na altura da menstruação é frequente existirem mais crises de enxaqueca, o que está relacionado com a variação hormonal, já que nesta fase existe uma queda abrupta do nível de estrogénios. Apesar desta importante influência, na grande maioria das mulheres, as crises acontecem também fora da altura da menstruação. Só em cerca de 11% é que as crises ocorrem exclusivamente na altura do período menstrual e tendem a ser mais fortes e incapacitantes.
A contraceção hormonal tem influência na enxaqueca podendo a sua utilização agravar esta doença. As pílulas combinadas de baixa dosagem são consideradas seguras nas mulheres com enxaqueca mas não devem ser utilizadas no caso de enxaqueca com aura. Nas mulheres que sofrem de enxaqueca com aura privilegiam-se as pílulas apenas com progestativos, habitualmente conhecidas como pílulas de amamentação. As opções de contraceção devem ser discutidas nas mulheres com enxaqueca.
A enxaqueca é uma cefaleia primária e pode ocorrer com ou sem aura. A aura surge em cerca de 20% dos indivíduos com enxaqueca. A aura, cuja denominação advém do grego, significa «aragem ou brisa». Esta denominação é atribuída assim aos sintomas suaves e breves, que geralmente avisam da chegada da «tempestade», representada pela crise de dor intensa e incapacitante da enxaqueca. A aura é definida como o conjunto de sintomas neurológicos que acompanham a crise de dor e que são recorrentes, habitualmente, com 5 a 20 minutos de duração e completamente reversíveis. Na maioria dos casos, cerca de 90% das pessoas que sofrem de aura, os sintomas são visuais. As descrições mais comuns são de alterações como brilhos, luzes ou linhas em zig-zag. Menos frequentes são os fenómenos sensitivos como os formigueiros e muito raramente surgem outros sintomas como visão dupla, falta de força muscular ou alteração da fala. A aura acontece frequentemente antes do episódio de enxaqueca. No entanto, pode ocorrer depois da dor ou ainda de forma isolada.
As pessoas que sofrem de enxaqueca devem adotar um estilo de vida saudável: deixar de fumar, praticar exercício físico com regularidade, evitar a fadiga/cansaço, ingerir a quantidade suficiente de água, identificar situações que provocam stress e ansiedade e tentar modificá-las, manter um horário regular de sono, evitando a privação de sono (dormir menos horas que o necessário) mas também evitar dormir demais. Devem deitar-se sempre à mesma hora e levantarem-se sempre à mesma hora.
Embora seja muito comum afirmar-se que os alimentos desencadeiam crises de enxaqueca, este é um assunto controverso. Nas pessoas com enxaqueca que fizeram dietas restritivas (deixaram de comer alimentos ou grupos de alimentos que se pensavam poderem provocar crises de enxaqueca) os resultados obtidos foram contraditórios. Também quando se pede aos doentes para preencherem diários de cefaleias e diários alimentares não se nota qualquer relação entre a ocorrência das dores de cabeça e o tipo de alimentos. Desse modo, não faz sentido evitar alguns alimentos ou fazer dietas mais ou menos rigorosas na tentativa de evitar as crises. Deve ser usado o bom senso e apenas retirar um alimento se notar que cada vez que ingere esse determinado alimento aparece uma crise de enxaqueca e apenas nessas situações. Os alimentos/ bebidas mais frequentemente apontados como desencadeantes de crises são: as bebidas alcoólicas ( e entre elas o vinho tinto), a cafeína em excesso, os curados ( bacon por exemplo), a comida chinesa, os citrinos ( laranjas, limões, tomate), as gorduras, os lacticínios, os condimentos e o chocolate. O mais importante é evitar o jejum prolongado comendo regularmente pelo menos de 3 em 3 horas. O jejum prolongado e o não tomar o pequeno-almoço é um desencadeante frequente das crises de enxaqueca, sobretudo nas crianças e jovens, situação que facilmente se pode evitar.